sexta-feira, 31 de agosto de 2012

IX - JUAN DE CÓRDOBA



Mas, antes de relatar as advertências e o consequente término do enlace amoroso, é indispensável esclarecer um dado que não te forneci sobre meu pai, no entanto iniciei-o sem êxito no sétimo capítulo.
Corroborando toda uma heterogeneidade, o marroquino Juan de Córdoba era cigano – entretanto um atento leitor já deveria ter percebido. Sim, era um gitano islamita, por isso toda aquela história sobre sua origem. Somente um antropófago cosmopolita poderia reunir diversas culturas, aproveitando-as concomitantemente.
Segundo a governanta africana, ele não usava brincos ou tapava um olho, quem usa esses apetrechos são piratas. Da minha parte, nunca ouvi dizer que um sarraceno usasse afins. Dizia ainda que somente conhecia o mistério das cartas por ser filho único; isso se realmente conhecia. Sua mãe não tivera uma criança mulher para ensiná-la o jogo da adivinhação, caso contrário, a ele não seria ensinado, pois esse jogo é destinado às mulheres.
Ele era um mouro que se trajava todo de branco. Usava um pano branco comprido na cabeça com corda presa ao redor dela. As suas vestes, quando andava, flutuavam, iam embora pelo ar. Eram enormes! Tinha um outro traje comprido que prendia na canela, vindo uma saia – assim chamo – abaixo dos joelhos. Quando me apareceu em sonho estava justamente com uma calça até a canela, com um pano ao joelho, uma blusa larga nos braços, um lenço enfiado na cabeça preso por duas cordas, um medalhão similar a uma estrela de cinco pontas no peito e um lobo branco ao seu lado.
Em sua época, estava havendo um conflito entre os que chamam de ciganos, na França e na Espanha. Tentavam expulsá-los à força. Havia uma luta muito grande por libertação, por um mundo melhor. Ele não pertencia àqueles ciganos que ali estavam, por isso é que não sei dizer se voltou a Marrocos depois do fim do relacionamento com Judite.
Estava na Espanha por causa de parte de seu povo. Não havia nascido naquela terra. Saiu de onde estava, Marrocos, para assistir à perseguição imposta ao povo dele na Europa, à sua dissolução: quem permaneceria ou partiria. Ali muita mistura houve. No entanto, quando Juan esteve lá, não havia mais esse grande desespero, houve um abrandamento. Os interesses mudaram. A dissidência que houvera era por causa das perseguições a quem ia para um lado ou para o outro. Leitor, ajuda-me! Procura saber o tempo que Juan de Córdoba viveu. Deve ter algum relato ou lenda sobre esse homem. Se procurardes no meio dos ciganos, encontrá-lo-ás. Essas pessoas doidas que ficam chamando, arbitrariamente, por cigano, de tua época, que o respeitam muito, indaga-os. De repente, quem sabe, dirão que estou errado, azeite! Importante é a realidade e não a verdade.
Esse místico abaporu, meu pai, foi o cigano árabe Juan de Córdoba. O povo espanhol havia nomeado-o assim quando o recepcionou. Provavelmente, seu nome verdadeiro em árabe deveria ser de pronúncia esdrúxula ou de difícil articulação oral aos gaditanos.

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